domingo, 16 de dezembro de 2012

Eu devia era recolher todas essas metades de papel do chão do quarto, guardanapos escritos em mesa de bar, rabiscos nas últimas folhas de meus cadernos e transformar em livro.

sábado, 1 de dezembro de 2012

"on a drive from solution to surface"

Recebi uma carta numa terça-feira à noite contendo um pequeno abalo sísmico. Desde então encontro-me em dois lugares ao mesmo tempo - situação que vivi durante alguns bons meses no passado e ainda assim me deixa bastante desconfortável. Este estado de não-ser-não-estar-não-sentir me levou a negligenciar umas muitas coisas bastante relevantes. Devo dizer que me deixou bastante preocupada não ser capaz de me importar... senti que veria tudo ir água abaixo e não conseguiria levantar uma palha para impedir.

Até que nessa madrugada de segunda-feira algo aconteceu:

abri uma janela do Word. Escrevi uma palavra, uma linha, um parágrafo, dois. Carta feita. Enviada. Dedos cruzados e um álbum de nome Europe tocando sem parar nos meus fones cor-de-rosa. Muita, muita paz.

E me veio a cabeça uma constatação que tive numa dessas noites de tomar chá aromático na madrugada brasiliense, falando de amor e inquietação. Eu disse à minha gueixa que as coisas advêm do desejo e ela imediatamente respondeu que não, além de mostrar-me que sou a última pessoa do mundo que deveria crer nisso.

A verdade é que no decorrer de minha vida encontrei muito mais lugar para acasos incríveis do que para realização de sonhos. Por essa razão, fico tranquila com os caminhos pelos quais sou forçada a seguir. Desassossego, reclamo, proclamo as maiores injúrias, eu sei. Porém bem dentro de mim sei que vai me levar exatamente onde devo ir.

Então é isso, destino... universo... é isso. Tá aí. Coloquei mais uma vez na palma de tuas mãos.
Ajude-me a encontrar outra vez os caminhos que me levam para o mar que me chama.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

european redneck

I've got a cigarette hanging from my mouth as I stare at you, who won't even realize it, so absolutely immerse in whatever it is you're doing - I try to snoop in your business by seeking the reflections on your glasses, but fail to do so.
You're smoking as well, but you're not like me, no. You inhale in much more aristocratic manners and the cigarette you're holding is a delicious mix of herbs wrapped by corn chaff.
And I keep on looking, 'till the waves on your hair starts mixing with the circles of smoke you got around you and the spirals of bad decisions you take.
There's nothing I'd rather watch instead.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

trecho de uma mensagem para mi Morocha

(...)

Já faz algum tempo desde que comecei uma reflexão acerca da pequeníssima quantidade de tempo que dedico a mim mesma. Só a mim, a saciar meus desejos e curar minhas ânsias. É pouco o tempo e muita a gente à minha volta. De forma alguma isso é uma coisa ruim; longe de mim não querer esses amores florescendo minha existência. No entanto, sinto como se houvesse um ruído constante entrecortando meus pensamentos. Preciso muito estar só para começar a alinhar o que há dentro de mim. Morocha do céu, haja alinhamento para essa desordem começar a se desfazer em calmaria. Haja limpeza debaixo dos tapetes que passei tanto tempo usando como esconderijo para as coisas que queria fora do meu campo de visão. Sinto mais do que nunca que é hora de abrir meu peito. Deixar fluir, deixar passar. Aliviar um pouco do peso que sempre carreguei como troféu - tantos corações partidos, tantos quereres que não passaram de vontades frustradas, um tanto de tudo que já me causou muito pesar, mas que perdoei porque também me causou muita inspiração. Só que meu objetivo agora, Morocha, é correr cada dia mais rápido, e só é possível fazê-lo sem correntes nos calcanhares. A solidão sobre a qual lhe conto é esta que vem junto com a mais intensa das sensações de liberdade.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

tchaô

Não importa quanto tempo vá ficar fora, sempre levo comigo o suficiente para estar bem em qualquer lugar, sem nunca precisar voltar. Não importa se Alaska ou caatinga, tenho comigo de casaco de neve a um par de biquíni. Não importa se há uma cama à minha espera ou se somente nos é permitida a estada na área do quintal, o saco de dormir me acompanha.
Acabo de preparar a mala que estará comigo pelos próximos dias: umas vestes, Malba Tahan e Roberto Freire, câmera fotográfica instantânea, sanduichinhos e barras de cereal, ervas, páginas em branco e canetas, sandálias japonesas, vinho, rede... Não sobrou lugar para neura dessa vez.
Daqui a umas poucas horas partirei e não há sensação melhor para esta sagitariana que vos fala do que ir embora. Mesmo que seja para perto. Por pouco. Pra voltar. A verdade é que me encantam os não saberes do caminho e isso que chamamos - carinhosamente ou não - de lar está recheado de mais do mesmo. Me deixa. Deu pra ti.
"Eu vou mas volto", lhe digo isso porque parece que é só assim que tu me deixas ir, em Brasília.



## Falta coesão neste escrito. O problema (ou não) é que depois de uma seca de inspiração, sofro agora de um tsunami de informações, ideia e querências clamando por tornar-se um algo. Então vem ideia vai ideia vem ideia vai ideia e não sei qual é a mídia certa. Fui de laptop a máquina de escrever, passando por papel e caneta, me parece tudo errado, eu devia era dormir.

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

extract of When Love Arrives, by Sara Kay and Phil Kaye.

"(...) Do not forget this: love is not who you were expecting, love is not what you can predict. Maybe love is in New York City, already asleep; you are in California, Australia, wide awake. Maybe love is always in the wrong time-zone. Maybe love is not ready for you, maybe you are not ready for love. Maybe love just isn't the marrying type. Maybe the next time you'll see love is 20 years after the divorce: love looks older now, but just as beautiful as you remember. Maybe love is only there for a month. Maybe love is there for every firework, every birthday party, every hospital visit. Maybe love stays. Maybe love can't. Maybe love shouldn't (...)

When love arrives, say: 'Welcome, make yourself comfortable.' If love leaves, ask her to leave the door open behind her. Turn off the music, listen to the quiet. Whisper: 'Thank you for passing by'."

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

loca como tu madre.

What was it that happened to you and me and turned us upside down? Like the strongest of the waves unexpectedly arrives when you're floating on the sea, facing the sky on a cloudless sunny day; suddenly all you can see is the darkness of the bottom. It takes you a minute or two to recover from the shock, and still you'll be wary for a while before you're able to surrender to the water again. It feels like we're still in the restoring bit of the process after having way too much salty water coming down our throats.
You're suffering from a heartache, doesn't know what to do with the love within you. I'm cold as a rock, incapable of truly open to what is to come. Moreover, there's this constant restlessness that keeps on growing exponentially. "You're a mess. I'm a mess too, trust me". What we certainly are not is this brand of unsatisfied, powerless folks. Where did we leave our strength? Where's the lost and found section??
We're watching broken TV's, staring at grey screens, listening to its hisses... waiting for something to soon be on so we won't be so amazingly bored by our absence of existence. We might not be having the time of our lives, but let's just face the fact that we're living the life of our now. So drink up your mojito, even though it's still Tuesday, and hope that tonight we are not going to bed before something good happens.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

alors quoi, Adonis?

Se esse abraço tivesse durado um pouco menos, talvez não houvesse tamanha falta de equilíbrio em mim passadas tantas horas. Posso afirmar que os primeiros segundos - aqueles que são de praxe, pedidos pelas normas de etiqueta - foram nada mais do que corriqueiro encontro de superfícies. O problema é que estes nossos corpos não perdem tempo em encontrar alguma maneira de encaixar-se um no outro de maneira a colar também nossos corações e almas, e foi ali que ficamos por tanto tempo quanto seja o que passou. Não conseguiria me atentar ao caminhar de ponteiros do relógio; sem que me desse conta, minha medida de tempo passou a ser a cadência de sua pulsação. Senti meu peito abrir-se de maneira orgânica, totalmente natural. Senti um querer-lhe bem tão grande. Senti vontade de fazer-lhe umas muitas perguntas. Só que o universo sabe dos seus. Fez do povo um vendaval e nos tirou do transe causado pelo reencontro. Agora éramos só restos de divindade, com uma inegável pitada de ressentimento por tudo que passou e receio do que poderia significar aquele inesperado suor nas mãos.

sábado, 22 de setembro de 2012

falta de sono e vontade de dormir

Uns dias (mais que outros) acordo meio desnorteada, com vontade de não ser. Noutros, a falta de norte acontece em algum momento aleatório e me vejo atravessando pistas sem olhar se vem carro, saltando do ônibus três paradas depois da que deveria. Hoje aconteceu na escadaria do Hotel Nacional. E não saberia bem dizer como cheguei ao momento de parar naqueles degraus, encantada pela beleza da combinação de cores da luz refletida numa árvore com o céu já quase noturno.
Fiquei e fiquei e fiquei. Fumei um cigarro. Fiquei mais um pouco. Só descobri que havia alguma coisa errada quando me dei conta de que realmente não sabia para onde deveria ir.
Pensei que há um par de amores no Velho Continente, outro par en el Norte, unzinho na América Central. Pensei que há um curso de História da Arte com mais tradição em Porto Alegre, que minha universidade dos sonhos é em New York e que seria delicioso andar de bicicleta despreocupadamente pelas ruas de Amsterdam. Pensei que morar com os pais aos vinte e poucos pode até ser norma aqui pela América Latina, mas minha multiculturalidade me faz ver essa minha condição com maus olhos. E depois dessas reflexões, me veio o mais imediato dos questionamentos: e agora, agora, AGORA... para onde vou?
Sabendo que raras pessoas entendem minha poética de vida, pedi socorro a um ser humano cuja poesia geralmente casa com a minha - por mais que tentemos arduamente convencer-nos que somos opostos.

"simplesmente não sei para onde ir
literalmente
parei no meio da rua
me fala para onde ir"

Sem que ela soubesse sequer em que setor, bairro, rua eu estava, sua resposta me levou magicamente a... uma agência de viagens. E ali levei mais uns bons minutos. Pareceu-me uma brincadeira deveras deselegante do universo para com alguém que só pensa em ir embora of this two star town. Era algo como "está aí, bem na sua fuça, a cura de todos os males que lhe afligem... o único problema é que já passou do horário comercial, além de que amanhã é sábado e eles não abrem".
Lembrei de um alemão que passou pela minha vida. Estávamos na passagem entre Conjunto Nacional e Conic e olhávamos a Torre. Ele disse que, entre outras peculiaridades, o que tornava Brasília interessante era o fato de que à primeira vista tudo parecia muito perto, mas quando você tem que chegar a algum lugar específico, é quase inalcançável. Ando começando a achar que essa característica de minha cidade contagiou meus desejos: eles estão todos ali, logo onde posso vê-los, mas se fazer cada dia mais distantes.
Voltei para casa umas três horas depois do planejado. Ao sair do ônibus, senti escassas gotas. Só subi depois que a chuva se fez real e retratou-se pelos quase quatro meses de ausência. E pouco importa se eram ácidas as gotas caídas do céu de cores mais belas do planeta Terra: era a limpeza que precisava nesse momento.
O desnorteio seguiu comigo, e me dá um medo tão grande quando deito na cama e não consigo me desligar do mundo "real". Ah, é que o mundo dos sonhos é meu refúgio maior, e é essa a salvação que necessito nessas horas de perdição.
Por sorte, preencher linhas e linhas e linhas consegue acalmar-me, acalentar-me... e logo logo o sono vem.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

música de sarau

O álbum começa com "Vazio" e é bem assim que se deveria escutar o CD por inteiro: num vácuo de preocupações. Dessa forma é possível passear pelos sentimentos tão singelos presentes nas letras e músicas de Eros Trovador. Passei uma tranquila madrugada ao som de sua voz.
O calor do cerrado em mês de setembro me impedia o sono, mas em vez de lutar contra o desconforto causado por ele, me rendi. Abri todas as janelas e sentei-me perto do parapeito. Coloquei meus fones cor de rosa e entrei no "Mundo dos Pirulitos de Coração", caminhando com meu "Passo Leve" sobre o "Silêncio Cadente" do "Poeta". Foi um encontro de memórias e sensações que me provocou perguntar-me algumas vezes se não havia sido eu quem havia vivido e sentido aquelas emoções que me estavam sendo recitadas.
É que a vida é cheia dessas poesias, sentimentos e comoções entrecruzadas. E é muito gostoso o sentir compartilhado.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

demasiado fuego I


Segunda-feira, cinco de dezembro de dois mil e cinco. Era a noite de encerramento do Senhor Festival, na Funarte. Era meu aniversário de catorze anos e a primeira vez que eu ia sozinha a um show. Fui ao encontro de minha irmã e um amigo dela, por quem me havia apaixonado pela primeira vez na vida, no auge dos meus... sete anos de idade! Paixão esta que obviamente nunca saiu do campo do platônico.
Cheguei no início do show de uma banda brasiliense que tocava um delicioso ska que me fez dançar do começo ao fim. Quando tomei uns segundinhos para recuperar o fôlego, olhei mais apuradamente para o palco e... neste momento precisei tomar um tempo para decidir que expressão faria jus ao que senti naquela hora; nada me pareceu adequado. O ponto é que me apaixonei perdidamente pelo vocalista. Este amor tornou todo e qualquer outro homem incompleto caso não fosse provido de barba e um nariz bastante proeminente, não tocasse numa banda de rock e não fosse professor de História, além de bacharel em Filosofia.

Sábado, doze de abril de dois mil e oito. Era o show de uma das mais legendárias bandas da existência, percussores do ska. Estávamos eu e mi morocha dançando de olhos fechados ao som do Criolina e ao abri-los de leve, vi que ao meu lado estava o tal vocalista narigudo. Andei em direção a ele e disse que gostava muito do trabalho de sua banda, que tanto as letras quanto o som mexiam muito comigo, que estava presente em todos os shows. Ele agradeceu, disse que era bom escutar isso. Ainda me perguntou um par de coisas, contou que tocaria depois do show principal. Devo dizer que fui totalmente pega de surpresa pela simpatia e doçura do meu muso.
Foi uma delícia absurda ouvir àqueles deuses jamaicanos. Já estava fora de mim de tanto encanto quando a visão daquele homem tão belo se fez plectro em cima do palco. Cantei com ele todas as canções, e agora já não tinha mais os olhos fechados, os tinha bem dentro dos dele, que me devolvia a mirada e sorria de uma maneira a acender fogos em lugares cuja existência eu desconhecia.

Sexta-feira, 14 de setembro de dois mil e doze. Era a noite de um dia no qual passou constantemente pela minha cabeça que havia tempos desde a última vez que havia saído para dançar um bom rock. Como a falta de opções nos leva a fazer sempre mais do mesmo, fui ao antrinho das sextas à noite da capital. Descobri logo antes de sair que seria o senhor supracitado o responsável por comandar a pick up durante um tempinho da noite. Tendo em vista que a última vez que meus olhos haviam pousado sobre ele fora há mais de três anos, fiquei realmente curiosa quanto às reações fisiológicas deste “encontro”.
Conversava com minha gueixa perto das mesas de sinuca e ele passou. Nossos olhares se cruzaram por não mais que dois segundos, ele andava rápido em direção ao backstage. Senti as pulsações do meu coração em treze lugares diferentes, desde o calcanhar até o ombro. A coisa ficou mais séria quando ele estava detrás de todas as aparelhagens DJísticas e eu lá na frente. Nessa hora minha companheira já havia decidido terminar sua noite e eu estava só na pista.

Fechei os olhos e do nada tinha quinze, dezesseis anos outra vez. Meu desassossego era só uma semente, não sabia a dimensão que tomaria este sentimento com o passar do tempo, da vida. Estava descobrindo o sabor do álcool e a delícia de fazer tudo o que fosse ilícito. O que me causava inquietação era quase sempre efêmero. Havia rotina e estrutura e uniforme. O leito por onde eu correria me levaria a desaguar num mar de estabilidade.

Ao abrir outra vez os olhos, estava no hoje, no agora. Quase vinte e um anos, um desassossego transbordante e nenhuma certeza. Alguns resquícios de outrora, no entanto, ainda se fazem presentes: a mesma propensão a paixões fugazes e o mesmo encanto pelo proibido.

Aquele momento suscitou sentimentos tantos que não saberia transcrever – talvez devesse ter sacado meu caderninho ali mesmo e anotado umas palavras chaves para lembrar depois. Só sei que me invadiu uma sensação de liberdade que não sentia há tempos. Tive a realização de que existem sim pontos finais e que eles não precisam ser dolorosos.

Vê-lo foi deliciosamente surreal e nostálgico. Ele foi o primeiro de uma série de platonicidades que me serviram de material para várias historietas. Foi quem me causou minha obsessão por groupies e minha vontade de tornar-me uma. Foi quem me despertou um olhar mais safado sobre meus professores de História.

Eu espero que ele seja muito feliz.

sábado, 8 de setembro de 2012

oh céus

Um dos amores de minha vida me cuidou durante meu processo de cura de uma grande paixão. Foi meu melhor amigo durante algum tempo, meu namorado durante algum outro. Quando começamos a compartilhar cama, antes mesmo de isso ter qualquer conotação sexual, ele enxugava minhas lágrimas todos os dias nos quais acordava mal e dizia assim, baixinho:  "tienes que dejar de llorar por las mañanas...".
Hoje passamos uns minutinhos ao telefone e foi a primeira vez em quase dois anos que ouvimos a voz um do outro. Foi tão surreal que quase não soubemos o que dizer. Nos separam milhas e milhares de vivências. Nos une este passado e o fato de sermos os dois uns desassossegados.
Pensei em dizer-lhe que se ele dormisse comigo nos últimos tempos, com certeza me diria que eu deveria parar de chorar nas noites. Este hábito chegou junto com a agonia de sentir-me presa ao passado, à mesmice, à capital.
Minha felicidade se extingue cada dia mais, e com ela vai embora até minha vontade de escrever.
Sou um nada aqui. Quero ir embora mais do que qualquer coisa.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

cadê o meu agora?

Sinto o coração cada vez mais apertado com a realização de que minha felicidade se encontra em pastas de foto no computador, caixas no armário do quarto e postais que chegam pelo correio.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

uma linha e meia


Demorou quase duas semanas para que houvesse comunicação entre nós.
Minha vontade, obviamente, era escrever-lhe contando os mínimos detalhes de minha vida após sua entrada nela, todas as inquietações que a presença de um oceano literal entre nós me causava. Ou, não sei, falar de assuntos do dia-a-dia, que a maneira tão diferente como experienciamos os momentos tornaria qualquer que fosse o pepino cotidiano algo interessante de compartilhar. O que me impedia de fazê-lo era o fato de não saber como a informação alcançaria o outro lado da tela. Ainda que uma das coisas mais instigantes entre nós era exatamente este não saber absolutamente nada - éramos um grande mistério um para o outro, ávidos por descobrir-nos - há um ligeiro medo envolvido nesta nossa conexão.
Foi com muita surpresa que me chegou uma mensagem sua ao nascer o sol na manhã de ontem - para ele já era quase um meio dia de verão. Imagino-o de cabelos molhados em sua sala de móveis, paredes e pisos brancos. Milhares de filmes e livros de arte nas várias prateleiras. Foto da filha na mesa ao lado do sofá. Uma vitrola e vários discos de jazz em volta. Um par de livros de literatura francesa entre as almofadas. Ele fumaria um cigarro olhando a vida acontecer do lado de fora da sua janela. Pensaria na razão para quase ter perdido o avião que o levou da América de volta ao Velho Continente. Sentaria em frente ao seu computador e tomaria uma eternidade entre uma palavra e outra do que me viria a enviar.
Tudo isso, no entanto, não passa de meus desejos sendo tomados por realidade. Só o que sei com certeza é que para escrever-me uma linha e meia, incluindo nesta uma insinuação de afetuosidade e referência a uma brincadeira íntima, ele provavelmente levou o mesmo tempo que eu para apagar metade do que havia redigido e deixar minha resposta o mais sucinta possível, com apenas quatro parágrafos de quase dez linhas cada.
Foi bem nesse momento que percebi que esse "nós" tem certo risco de fracassar.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

muse fortuite V

Sei que há maiores possibilidades de encontrá-lo a caminho do Nordeste, num ônibus caindo aos pedaços que quebraria cinco vezes durante o caminho. Ou ainda depois de um show do Gil  nos subúrbios da capital riograndense, todos absolutamente apaixonados por aquela fera septuagenária que ainda consegue bailar da primeira à última música nestes palcos da vida. Ainda assim, é incontrolável essa mania de buscá-lo pelas superquadras desta cidade. Aprendi dessa forma, de tanto procurar por suas pegadas nos meios-fios, que cair de amor na capital federal se faz perigoso pelo tanto de concreto que há em suas ruas.
Ah, e como não tentar vê-lo na multidão de um domingo como este? Sabendo que, como poucos, ele responde afirmativamente às duas perguntas essenciais na busca do homem perfeito - fala francês? gosta de jazz? - não é de se estranhar que estivesse com meu binóculo a postos, buscando entre conhecidos e desconhecidos que se maravilhavam com o som alucinante dos Dukes of Dixieland aqueles olhos de ser místico.
Nem o vi, pobre de mim. E sigo na vã busca da magia cigana de ma muse fortuite.

sábado, 4 de agosto de 2012

rendez vouz

Ele me causou um curto-circuito tão intenso que desde sua aparição não fui capaz de escrever um só continho, uma só crônica, uma só receita de bolo. Mal durmo. Depois de três parágrafos de um livro já sou sugada pelo repuxo do mar das memórias com ele.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

meu café frio e um sol de meio dia.


Na minha frente, uma página branca de Word e na minha cabeça o mundo inteiro. O mundo inteiro e nada se misturam e acabam por se converter em um mesmo que. E a página continua branca.
Voam ideias no ar ao meu redor, mas não consigo segurá-las. É imensuravelmente difícil ser coerente, linear, fazer sentido. Está fora do meu alcance escrever o que não sou. E o que mais não sou na vida é coerente. Linear. O que menos faço na vida é sentido.
(abril de 2012)

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Diana,

tô tomando chá de laranja e especiarias adoçado com mel, como se me tornasse a antiga eu novamente. Mesmo que apenas pelo espaço de tempo que se leva para tomar uma xícara de chá. Ontem à noite choveu em Brasília, imagina o céu caindo em julho neste cerrado tão seco. Nem vi acontecer. Só vi os resquícios que a precipitação deixou no asfalto. Minhas paixonites crescem exponencialmente, como se amor fosse consequência imediata de um olhar mais fundo nos olhos. E quando estou segura de que já não tenho mais coração pra abrigar tanto amor, eis que mais alguém faz espaço ali dentro. É minha sina amar demais. É minha sorte também.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

salvação

São curiosos os pensamentos que surgem em caminhadas solitárias. É como se as milhares de experiências pelas quais passamos formem uma costura e finalmente façam sentido em meio ao caos que é a vida. Por isso aprecio tanto os momentos que tomo para mim.
O universo me permitiu uma boas horas sozinha na noite de hoje e já no final dela, caminhando em direção ao ponto de ônibus, me lembrei de uma noite em um café brasiliense. Estava com três outras mulheres, todas elas em seus vinte e muitos anos, e falávamos de amor - tópico recorrente em muitas de minhas conversas. Não só de amor mas de buscas, de aspirações no âmbito afetivo.
É necessário dizer que estava atipicamente calada esta noite, desconfortável em compartilhar minhas experiências com a mesa. Estranhamente sentia a impressão de que qualquer coisa que dissesse pareceria tola, que meus escassos vinte anos não me davam bagagem suficiente para acompanhar aquele bate-papo. Ou talvez estivesse distraída demais pelo delicioso sabor do enorme café que pedira já no início da noite. Não saberia dizer bem a razão, mas algo me deixara na posição de observadora da interação alheia.
Entre muitos tópicos discutidos, um deles me deixou bastante pensativa durante muito tempo. Foi bem ele que me voltou à mente na noite de hoje, não mais como questão a ser respondida. Elas falavam do que costumavam buscar em suas relações afetivas há alguns anos e o que buscavam agora.
Bom, foi aos treze anos que comecei a pensar relacionamento. Foi bem ali que surgiu aquele primeiro amor arrebatador cujas características tornam-se parâmetro para vários outros amores até que você finalmente perceber que amor de adolescência é amor de adolescência, e passa. Olhando para trás, passando um por um até aquele mais antigo amado, foi possível perceber um padrão claro.
Muito mais do que o encanto causado pelos atributos físicos ou intelectuais do meu objeto de afeição, era o meu momento que definia o que aconteceria entre nós. E eu, como boa chica Almodóvar, estive constantemente Al Borde de un Ataque de Nervios, o que me levou a sempre procurar salvação no outro.
E perceber isso me fez apreciar muito, muito mais o fato de estar sem ninguém, caminhando sob uma lua inesperadamente grande. Prezei em demasia o fato de que é bem assim que consigo ter os mais poderosos insights da vida. Só assim que posso me salvar.
Hoje, e talvez só por hoje, sou o único amor do meu agora.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

tu não deve estar entendendo nada.

Deve achar capricho de minha parte desviar meu olhar do teu ou esquivar-me do aconchego dos teus abraços. Deve me tomar por infantil por não compartilhar contigo o que me inquieta a ponto de tornar inviável nossa estada em um mesmo recinto. Deve até mesmo pensar que me valho de joguinhos neuróticos burgueses com o intento de causar-te ciúmes.

Tudo errado.

Se não te quero olhar assim tão longamente é porque sinto-me completamente desnudada pela sua mirada e isso me embaraça. Se não lhe digo meus porquês é porque estes ainda não estão completamente claros nem para mim. Se compartilhei a noite inteira com outrem é porque o calor que ele emanava em minha direção era tão acolhedor quanto aquele da fogueira que nos iluminava a noite estrelada e porque seus beijos não vieram acompanhados da grande dose de drama que encontrei nos lábios teus.

Nem tudo tem a ver contigo.

Saiba.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

plural you

The cold autumn wind springs into my window and slides under my blanket, waking me up at 3 am. This is right when I miss you the most. It is also when I realize that a single bed is way too big for one person, and so are the mangoes and bags of strawberry they sell on the Sunday morning fair. These are some of the things I learned to share with you.

quarta-feira, 30 de maio de 2012

La Clandestina

Acabo de pintar minhas unhas de amarelo com um dos esmaltes daquela coleção que tu me falaste que era super aguada, e tu estavas bem certa mesmo. O único que salva é o que comprei contigo e que tornou-se o esmalte da minha vida. Porém, como ando numas de renegar o de sempre, cá estou com unhas de cor amarelo mijo pós bebedeira e tomando chá verde sem açúcar. Eu perdi o costume de adoçar as coisas. Desde que tu fostes embora houve mudanças significativas na maneira como vivo minha vida. Desde perder o medo de andar de bicicleta entre carros, passando por trabalhar na Bienal até virar a ruiva que sempre tive vontade. Há tanto entre o desimportante e o essencial que nem saberia por onde começar. Tampouco sei se faria sentido listar de maneira linear tudo o que sucedeu, porque o charme de todos os eventos está na sinuosidade da maneira como aconteceram. Tu te lembras do quão habilidosa sou na arte de perverter o real em história pra contar. Mas ah, não foi para isso que me decidi por escrever este relato. Para ser bem sincera, o intuito real se perdeu nas torrentes de pensamentos que me atingem constantemente. Sei que era algo entre o chá e o esmalte, porém é até aí que me chega a lembrança. Agora faz mais sentido dizer algo que eu - e o resto do mundo - deveria ter escutado há anos, antes de jogar meu corpo no mundo: não te esqueças nunca das pegadas que deixas nos caminhos por onde passas. Porque da mesma maneira como lugares, momentos e pessoas se tornam lembranças eternas para ti, tu também te tornarás uma memória recorrente para outrem. Te conto a nascente da reflexão: há um ano e meio mochilei pela América Central com amigos. Em certo ponto da viagem, éramos apenas eu, Maria Alejandra, Roanna e Clara. Decidimos que em nosso primeiro dia juntas, faríamos um passeio em um cânion que ainda era pouco explorado. Se encontra ao norte da Nicarágua e se chama Somoto. Optamos pelo passeio mais longo, cuja média era sete horas. Obviamente extrapolamos este tempo; nos perdíamos em conversas com o guia, em viagens interiores, em jogar o colete salva-vida pro alto e nadar bem fundo no meio daquelas incríveis formações rochosas. Não há uma foto que faça jus àquela beleza, e olha que eu procurei. Bom, o ponto é que passamos o dia inteiro numa natureza praticamente intocada, eu, três amigas e um guia chamado Fausto. Ao fim de nossa jornada, Maria deixou seu e-mail com ele para que nos contasse sobre o futuro de Somoto, sobre sua família e os outros que vivem lá. Hoje, um ano e meio depois, ele lhe escreveu do e-mail de um amigo, perguntando como estávamos. Perguntou-lhe se seguíamos juntas, em que canto do mundo estávamos. Tantos dias, tantos encontros e tantas faces depois, aconteceu de este homem se lembrar de quatro meninas, uma de cada país, que lhe pediram para ser guiadas em um dia qualquer de dezembro de 2010. Estou maravilhada com isto! Me encanta a ideia de que não sou única em minha vontade de não esquecer as trocas que tenho pela vida. Que é realmente troca, não roubo! Que consigo deixar pedaços de mim pelo caminho. E tu também é assim, sabia? Duvido que haja quem esqueça facilmente tua qualidade de hipérbole, hipérbole. Lembra-te disso toda vez que passares por La Clandestina e tomares um chá pensando em mim. Ou quando o pôr do sol for tão bonito que tu tenha que parar e agradecer por estar viva para apreciar tamanha obra de arte. São bem nestas horas que teus trejeitos acabam virando personagens de livros alheios.

Sei que isto está meio sem pé nem cabeça. Creio que assim estou, sem pé nem cabeça. A verdade é que estou muito abalada pela chegada desse e-mail e de outro. Pela não chegada de uma mensagem. E pelos movimentos sísmicos intensos em minha vida.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

um tempo...

Meus escritos andam demasiadamente pessoais. Acho perigoso doar tanto de mim em um espaço como este. E isto é um pedido de desculpas por manter-me distante por algum tempo.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

do aeroporto

Depois de um tempo, cada minuto se transforma em todo um universo onde pensamentos se perdem, sugados para o inconsciente como se fosse este um imenso buraco negro. Assim é a solidão para mim: uma absoluta aniquilação da inspiração que impede a vida de se tornar insípida.
Foi uma pena para minha arte sentir um amor tão intenso quando não havia ninguém por perto para escutar minha dissecação obsessiva de cada momento compartilhado. E este pobre amor não se fez poesia nem conto, tornou-se nada mais do que uma coleção de pensamentos aleatórios anotados em pedaços de papel perdidos na minha bolsa, ao lado de embalagens de chocolate e guardanapos de restaurantes.
Vai tudo pro lixo.
O amor, inclusive.

sábado, 14 de abril de 2012

terça-feira, 10 de abril de 2012

domingo, 8 de abril de 2012

arde.

Acabo de ver teu nome na minha caixa de entrada e sentir meus batimentos cardíacos acelerarem, até quase chegar meu coração à garganta. (Sem Assunto) como assunto me deixou intrigada.

Mas é claro que não era nada,

escrever de ti é descrever desilusão.

sábado, 7 de abril de 2012

Mora na Filosofia

Eu vou te dar a decisão.
Botei na balança
e você não pesou;
Botei na peneira
e você não passou.
Mora na filosofia,
pra que rimar amor e dor?
Se seu corpo ficasse marcado
por lábios ou mãos carinhosas,
eu saberia, ora vai mulher,
a quantos você pertencia.
Não vou me preocupar em ver,
seu caso não é de ver pra crer...
Tá na cara.



Caetano Veloso

sexta-feira, 6 de abril de 2012

muse fortuite IV

Eu te encontro nessa vida sempre que o universo atende meu chamado. É que alguns dias (mais que outros) é essencial sentir o coração acelerar tanto que deixe meu pulso perceptível através da blusa. E isso, só quem me tem provocado é você, ma muse. Então tudo bem que nada relacionado a ti esteja sob meu controle... desde que eu sempre tenha seus beijos de boa noite.

terça-feira, 3 de abril de 2012

descompasso

Sempre soube dos perigos que existem no fundo dos olhos alheios, mas foi somente na noite passada que fui absolutamente arrastada para dentro de um par de olhos. Já havia me acontecido de ser tragada para um outro universo através de trocas de olhares profundos, mas estes eram acompanhados por palavras, toques e uma série de preliminares emocionais. Dessa vez porém, foram nada mais que duas enormes jabuticabas bem maduras que me olhavam assim, primeiro de longe, então mais perto, mais perto, até que sua respiração e a minha eram uma só, até que seu corpo e o meu se fundiam - das mãos aos braços aos abraços aos beijos.
E foi todo um desalinhar de eixos que me provocou ser engolida pelos olhos desse ser. Causou uma descoordenação total na bússola que me norteia. Ocasionou um pequeno terremoto nas poucas estruturas sólidas que tenho dentro de mim. Nem sei direito a razão de tamanho rebuliço, e talvez precise só de tempo para entender. Para parar de tremer com a lembrança daqueles olhos se acercando cada vez mais do meu campo energético e infiltrando-se em lugares que havia decidido fechar para balanço.

Balanço este que já não há.

sexta-feira, 30 de março de 2012

sem dormir.

Eu insone vou de zero a amor sem nem perceber. Fabrico contos que nunca chegarão à ponta da caneta, veja lá à vida real. Eu insone sonho mais que dormindo. Vou longe, longe... tão longe que até me sinto sair de mim. Deixo-me ali no morninho da cama e passeio despida de corpo pelos campos floridos da mente, atravessando fronteiras geográficas e temporais. Eu insone não tenho que ou quem me segure. Vou sozinha e livre recorrer o mundo, esquadrinhar pessoas e inventar encontros.

quinta-feira, 29 de março de 2012

antes que te vayas.

Eu não queria soltar sua mão e não era porque serão quatro meses com um oceano literal de distância entre nós. Afinal, são apenas quatro meses. Não queria soltar sua mão porque é deixar ir um momento que me parece tão belo e importante em sua construção... e eu sempre gostei de ver os câmbios tão sutis que ela sofre e a tornam cada dia mais uma mulher outonal. Tenho medo de perder a poesia que sai dela vezes em ondas vezes em garoa. Assusta-me a possibilidade de não mais entender o que seus silêncios significam. E vou sentir falta dos chás e tortas e charlas acerca del amor.
Pero hay búsquedas que una tiene que hacer sola, eu bem sei disso, então sorri ao olhá-la caminhar para longe de mim. Sorri ainda mais vendo as cores que ela deixou nas minhas mãos. E sorrio agora, quando penso no bem que lhe fará uma boa siesta depois do almoço, uma rodada de tapas no fim da tarde e uma dose de flamenco no fim da noite.

sexta-feira, 23 de março de 2012

tudo que vai

Passados meses, às vezes dias, momentos íntimos convertem-se em histórias de mesa de bar.

quinta-feira, 22 de março de 2012

com moderação...

O que começou como encantamento por seus atributos físicos dignos de deus grego entrou num processo de mutação cujo produto final segue um completo mistério para mim. Sem que eu percebesse, estávamos entrelaçados um ao outro energeticamente, nutrindo-nos com olhares que vinham desde bem fundo de nós. E, também sem que eu me desse conta, aquele frisson causado pela beleza de suas superfícies já não era recorrente. Rotulei, então, "desencanto", como foram tantos outros, e contentei-me com a chegada esperada do fim. Só então se revelou para mim um sentir distinto, algo absolutamente inefável que me confundiu em demasia. Percebi que o desejo antes puramente carnal havia aberto espaço para uma vontade possante de... de... descobrir quais carimbos ele tem marcado no passaporte ou quais matérias está fazendo este semestre ou alguma lembrança boba de sua infância. Assim, abriu-se um novo capítulo neste eterno livro que é a descoberta dos amores que se há de viver em uma vida: o amor moderado. E, por incrível que pareça, me assusta mais do que uma paixão arrebatadora. Vou ver como funciona...

quarta-feira, 14 de março de 2012

pegadora

Ela é tão bonita que me cala a boca... logo eu, a mais falastrona entre os tagarelas que conheço. É que ela tem um jeito de chupar o canudinho dessas bebidas doces que toma que me deixa sem graça, porque sei que ela já reparou que eu a encaro descaradamente. E ela dança ao meu lado, eu, já de olhos fechados, só sinto sua presença ali. Que vez ou outra ela chega mais perto e percebo o passear de seus cabelos pelo meu rosto e sentir o cheiro deles causa alvoroço nas borboletas do meu estômago.

E ela me faz rimar no meio da prosa, veja só. Acaba que estar com ela é meio poesia. Ainda terei coragem de convidá-la para tomar um sorvete comigo qualquer dia.

segunda-feira, 12 de março de 2012

"me gustaria mucho que estuvieras aqui para conversar"

Eu queria poder gritar bem alto que te amo, para que meu grito atravessasse os tantos quilômetros que nos separam e entrasse pelas fendas nas paredes do teu quarto. Buracos que eu fiz, não foi tu mesmo quem disse? Que cheguei con un martillo e fiz enormes janelas por onde entra luz e por onde escapas vez ou outra de ti? Pois seria por esses orifícios que meu clamor adentraria e encheria de cores as paredes do teu quarto e desenharia linhas desordenadas que te deixariam louco!

quinta-feira, 8 de março de 2012

noite qualquer

Eu segurava a terceira taça da noite e fumava o segundo cigarro do maço. Era Neruda que estava à minha frente, seu Poema 20 imprimido em letras negras sobre uma parede branca me falavam do amor que acabara. Eu dava goles épicos no vinho tinto que serviam e entre um trago e outro pensava em sair daquele lugar, caminhar vagarosamente por ruas vazias, silenciosas (já sem nenhuma taça de vinho, fumando o terceiro, talvez quarto cigarro), parar em frente ao bloco dele e gritar seu nome. É claro que não estragaria toda a poesia de um momento como esse interfonando. Interfonar. Essa palavra aniquila qualquer dose de magia presente em qualquer conto. Então eu gritaria seu nome na rua de sua casa, sem ao menos ter o que dizer. Pura e simples vontade de trocar uma ideiazinha ou outra com alguém que nunca me desafiou intelectualmente, com alguém que se fazia responsável por deixar minha vida - e eu mesma - mais leve. Mas não foi bem isso o que aconteceu. Esperei e esperei na parada por um ônibus que me deixasse minimamente perto de casa e caminhei, já sem nenhum cigarro e já recuperada do excesso de vinho. Caminhei por ruas agitadas, abarrotadas de carros indo sabe-se lá para onde, levando sabe-se lá quem dentro. Só o que percebia em comum entre eles eram os olhares que lançavam do conforto de seus bancos de couro. Perguntavam-se, nem que por um segundo, o destino daquela jovem perdida de cabelos cor de fogo.

terça-feira, 6 de março de 2012

mi otra vida.

Caminar por los pasillos con él, tomándome una taza de té de manzana y canela con limón. Acostarme a su lado en el anfiteatro y sentir todos lo pelos de mi cuerpo erizándose porque me tocó la mano con la suya. Sentir el olor de su shampoo en mi almohada. Comernos sopa (de las famosas en el pop-art) a las tres de la mañana porque estábamos los dos insomnes. Verlo vestido de esclavo mientras nos servía platos marroquís.

- Pero eso fue en otra vida.
- No fue otra vida, fue antes. Misma vida.

Besarnos en la boca, hacernos el amor.

- Fue mi otra vida.
- Está bien pues.

segunda-feira, 5 de março de 2012

muse fortuite III

Pensei nos nossos passos subindo escadarias quase correndo, enquanto tu declamavas uma canção que reconheci por razões que me fizeram ver ainda mais encanto em ti. Lembro que fazia muito calor, era um desses dias em que o sol fica a pino durante mais tempo do que deveria e tudo era amarelo claro. Tua pele branca contrastava de maneira mística com teus cabelos tão escuros e com teus olhos, teus olhos absolutamente mágicos que sorriam de maneira ao mesmo tempo pueril e sensual. Se há alguém no universo capaz de conter dentro de si todos os paradoxos, este alguém é você.

sexta-feira, 2 de março de 2012

herr L

Eu tive uma relação intensa com um professor de música há uns anos. Era uma amizade forte, nada usual para uma menina de 12, 13 anos. Ele continuou em minha vida até meus 17, quando minha adolescência construiu um grande muro entre nós. Ainda assim, senti que era ele a pessoa certa para escrever a carta de recomendação que me levaria para longe dele, de minha casa, de minha vida.
Estava eu sentada à sua frente, na sala onde me haviam sido injetadas as primeiras doses de filosofia e alemão, e agora ele me olhava e olhava o papel na mesa.

- Você sempre mexeu com coisas sérias - no sentido de perigosas - mas nunca se envolveu (...) Eu esperava algo ruim de você, ainda bem que você direcionou sua coragem para uma coisa boa.

Sorriu.

Ele, vez ou outra, ainda me tira os pés do chão e me roda no ar.

quinta-feira, 1 de março de 2012

the boy who looked like the little prince to me.

We were talking on a dark amphitheater, looking out to the trees that seemed oddly scary at nighttime. He was laying down, his head on my lap as I playfully touched his blonde curls and tried to memorize his face for eternity. He was looking up the whole time, almost not blinking at all and I bet he was somehow trying to read my eyes. His and mine were nothing alike, fact that led us to constant misunderstandings. He was the owner of the lightest blue eyes I had seen so far, and they were sweet, gentle, caring... I could even add lost to this list, since he was constantly on the search of something. Mine were dark brown gipsy eyes, always staring at an alternative north; I had a compass of my own and it would at all times lead me exactly where I needed to be at that very moment. My self-assurance always scared him out so badly that he'd flee whenever I got too close. But not that one night, not when he felt so safe in my arms.

(...)

mail me

My mail box is constantly bombed with news from elsewhere. Postcards arrive and leave like trains in stations... it makes me feel like time is not going as fast as it actually is. It prevents me from thinking that I'm wasting my life. After all, there is a constant flow of love to prove me that at least this I'm doing right.

muse fortuite II

Volte.
Ando querendo misturar teu encanto azul na aquarela de minha vida.
Não digo para mim, digo comigo; de qualquer forma, venha.
Com teus livros, com tua fala pomposa, com teu fazer-me pensar incessantemente.
Traga contigo tudo o que me eleva e enerva em ti.
Traga contigo todas as dualidades que exploramos tão belamente juntos.
Não te necessito.
Te desejo.
Desejo uma dose imediata do que me causa estar na tua presença.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

o segredo dos meus pais.

Ouvi um barulho usual, o abrir e fechar da porta da sala. Logo escutei a voz dele que, para meu total espanto, dizia ritmadamente:

"Um, dois, três. Um, dois, três."

Esgueirei-me até a sala, tomando cuidado, fazendo o mínimo de barulho possível. Escondida atrás da parede, consegui vê-los bailar na sala de estar daquela casa não guardava memórias de ninguém além dessa família. Ela esboçava um sorriso e estava bonita; havia escovado os cabelos naquela tarde, vestia vermelho e tocava-o de maneira amorosa. Ele tinha ares de aprendiz, seu olhar era compenetrado e contava com cadência militar cada passo.

Aquela cena me remeteu às viagens que costumávamos fazer juntos, anos atrás. Passávamos horas dentro de um carro rumo ao nordeste brasileiro e suas praias de águas de temperatura amena. Eu dormia no banco de trás e cada vez que um buraco na estrada me trazia de volta à consciência, lá estava ela falando incessantemente enquanto ele vez ou nunca lhe perguntava algo. Assim eles haviam encontrado seu equilíbrio: a verborragia dela encaixava-se com a introspecção dele. Levei alguns anos até me dar conta de que aquilo era amor. Manter-se acordada horas a fio para que ele tivesse sempre companhia ao dirigir era amor. Dividir sua atenção entre as curvas da estrada e suas histórias nem sempre interessantes era amor. Muito mais do que seriam as rosas que nunca lhe vi dar a ela no dia de seu aniversário.

Lhes observei pouco tempo. Deixei-os dançarem para as paredes que lhes observaram em bailes vezes doces, vezes tormentosos desde o Natal de 85. E, mais tarde, na mesa de jantar, fingi acreditar quando ele disse que a saída no fim da tarde havia sido para fazer as compras do mês.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

fascino

Um gato preto passava vagarosamente por minhas pernas, aninhando-se entre elas em busca de carinho.

Sorri.

Pensei na busca por carinho que levou um cigano a abrigar-se em meu corpo noite passada.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

first first.

I wrote a novel about your beauty before you noticed I was trying to look through your window and failing and falling. You didn't know I existed and I was already completely charmed by your unique last name. Or by the different tones your voice would reach depending on how serious or hilarious the topic of the conversation was. Or by the matching colours of your hair and eyes.
And I was never the girl next door you'd lay your eyes on, yet I lived at the house besides yours. And so knocking on your door with a silly excuse of asking for a soup or a box of mac & cheese had only one intention, which was letting you know I was there.

(...)

domingo, 19 de fevereiro de 2012

vo-cê.

A inspiração que me causavam nossos (des)encontros costumava fluir em ondas dignas de ressaca caribenha. Agora, já não passa de garoa paulista: insistente, irritante, absolutamente ineficaz em sua natureza de precipitação.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Porto Alegre Eu Te Amo

Era uma quinta-feira e era a primeira quinta-feira que eu passava naquela cidade quente cujas ruas e avenidas me causavam uma constante sensação de estar perdida. Como boa brasiliense, me surpreendia cada vez que passava por um arranha-céu - que para meus padrões era qualquer prédio que excedesse 6 andares de altura. E de tanto olhar para o céu, não percebi que passava por cima de uma daquelas saídas de ar de metrô, o que obviamente acarretou em um pequeno acidente. Lá estava eu, de vestido floral, perdida em Porto Alegre. E logo estava o vento traiçoeiramente levantando a saia do meu vestido. Ainda segurando-o com as duas mãos e provavelmente vermelha, vermelha como uma acerola, pensei:

- Que triste a vida de uma Marilyn Monroe sem classe nesta Nova Iorque sem charme.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

jogando tudo fora III

Sinto seu cheiro e seu calor adentrando a cama só bem tarde da madrugada. É que me mantenho acordada até que o som de seu pisar nas pontas dos dedos ao entrar no quarto me sirva de canção de ninar e a última coisa que sinto antes de dormir é a mistura de Tommy com ar condicionado. Quando acordo, seu lado da cama já está frio.

Não o vejo desde domingo.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

ébano

Não é sempre que me causas qualquer que seja a sensação. Na maior parte do tempo, sequer estás presente em meus pensamentos ou sonhos. Passaste por minha vida sem provocar grandes estragos e sei que também não fui exatamente um divisor de águas na tua.
Porém vez ou outra, devo confessar, me vens subindo pelas pernas por debaixo da mesa em um café ou enquanto me desdobro para entender o funcionamento do Excel. E alçando-se devagar, logo te fazes labareda incontrolável.
Consumo-me em desejo. É bem isso, só me vens em ondas de desejo sobre as quais não tenho o menor domínio.

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

sur ma muse fortuite

É que ele me causa uma inspiração tão peculiar que não me parece possível transformá-lo em prosa ou poesia.

Um dia,

palavreá-lo-ei.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

muse fortuite I

Ele me apareceu por primeira vez na madrugada de um dia qualquer, no meio de uma conversa na cozinha da casa dos meus pais. Tomávamos chá de maçã com canela, eu e una niña de mi pasado, e entre uma história e outra, seu nome surgiu. Depois disso sua existência se fez notável para mim na primeira vez que fugi dessa mesma casa. Aproveitando-me de sua ausência, fiz minha sua cama. Pude sentir toda sua energia cigana ao revirar-me no meio da noite, sem poder dormir, como se seus lençóis precisassem contar-me uma história ou duas.
Foi somente na terceira tentativa do acaso que, de fato, nossas vidas se cruzaram. A fuga dessa vez foi anunciada, mas não menos litigiosa. Lembro-me que eu lia Cortázar e almejava saber o que seria dos desencontros entre Oliveira e a Maga, e entre eu e meu chamo. Estava tão absorta que me tirou completamente o equilíbrio quando ele sentou-se ao meu lado. Sua chegada foi uma onda de encanto azul que não me deixou opção alguma que não render-me à doce violência de seu rebentar na costa.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

verde céu, prata lua.

Apaixonei-me pela crônica quando escrever sobre o cotidiano era escrever sobre um sonho. A vida era todo um espetáculo utópico; era subir colinas para ver nascer a maior lua em treze anos, cantar parabéns à meia noite no anfiteatro para um libanês aniversariante ou me perder na capital do mais rico (economicamente e só) país centroamericano.

Certa vez passamos toda uma tarde assistindo aos filmes mais piegas que se pode imaginar. Éramos eu, uma espanhola, uma norueguesa e uma israelense. Uma frase de Nothing Hill nos encantou muito profundamente. Foi a definição dada pelo mocinho ao seu encontro com a mocinha: "Surreal, but nice."

Surreal, mas agradável.

Deste momento em diante, decidimos que não faria sentido algum fazer qualquer intento de descrever nossa experiência nos últimos anos. Sempre que perguntadas, daríamos como resposta "surreal, but nice." E ter como rotina o surreal me fez infinitamente feliz pelo tempo que durou.

Então acabou-se o que era doce e estava eu de volta à cidade de onde havia fugido dois anos antes. Estava eu de volta aos mesmos cafés e clubes e camas. De volta à bucólica capital do país que orgulhosamente representei enquanto vivia como estrangeira.

Senti minha luz desvanecer pouco a pouco e logo me tornei cinza. Cor de cinza e cinza ao vento. Cinza, resto do que queimou. Cinza nada. Eu nada. Eu cinza. Eu sem tesão pelo cotidiano banal de garota planopilotense, sem inspiração.

Até que um dia o sol durou até depois das oito e meia da noite e a lua nasceu enorme no céu dessa Brasília. Foi este o dia no qual me dei conta da beleza que andava passando despercebida diante dos meus olhos. A beleza que há no fim de cada dia vivido.

Imediatamente voltei a me relacionar amorosamente com o agora.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

chá, chai e corrente.

- É que a vida é fluida, B. Não dá para colocar pontos finais...

Aconteceu numa dessas noites quando saímos para falar de um dos tópicos mais abordados em minhas reflexões: o amor. Comia um croissant de queijo e ela deleitava-se com uma daquelas tortas de chocolate que a fazem esquecer que estamos discutindo assuntos sérios, que daquele encontro pode sair a cura para todos os males do coração. Para ela, não há relacionamento mais importante que o do morango com o brigadeiro.

No vai e vem de nossos devaneios, lhe falei de minha necessidade de finais absolutos para que pudesse recomeçar. Ela me tirou as ilusões assim, sem meias palavras. Deixou-me nada menos que desesperada, morrendo de medo de ficar presa para sempre numa rede infinita de histórias inacabadas.

Pensamos em tomar chás para variar o lado gastronômico do encontro. As duas opções eram um chá preto com laranja e um chai aromático de frutas. Pedimos ambos, com a intenção de compartilhar - e também para que não precisássemos passar pelo martírio que é tomar decisões. Ao chegar com as bebidas, sem nem perguntar, a garçonete simplesmente colocou o frugal à minha frente, o negro à frente de minha companheira de dialética.

Enquanto tomava meu doce, doce chá, pensei que talvez a ideia de não-fins não fosse tão monstruosa. Talvez faça mesmo bem para a saúde deixar abertas algumas janelas do passado para arejar. Talvez o doentio seja tentar enjaular recordações e enviá-las em um navio para terras distantes. A adoção dessa nova perspectiva e o calor do chai me envolveram essa noite.

Pena que o sentimento não perdurou. Logo voltei à minha obsessão por finais definitivos, por palavras que marcassem que já não há. Continuei também a sofrer ataques de incerteza e angústia que tratava de curar com torrenciais crises de choro e automedicação alcoólica.

Foi uma carta de longe que me sanou as dores. Uma carta em espanhol sulamericano desde um país centroamericano. E não foi preciso nada mais do que apenas me recordar de um passado não tão distante para que tivesse um dos momentos de maior discernimento.

- Não é a vida que é fluida, meu doce - eu diria - o amor sim o é. O amor tem essa incrível capacidade da água de se converter em diferentes estados dependendo das condições do ambiente. E é essa mutabilidade do amor que faz com que não haja rompimentos definitivos ou paixões eternas.

Quando nossas bebidas chegaram, provamos de cada xícara e foi óbvio o encantamento que sentimos pelas que haviam sido colocadas com perícia científica pela garçonete. Desde o cheiro, passando pela cor e finalmente o gosto... era como se cada receita tivesse sido preparada sob medida. Havia em meu copo o doce de minha ingenuidade perante o viver. Havia em seu copo o sabor amargo das pedras com as quais ela construiu as muralhas em volta de si.

A verdade é que falamos da mesma coisa, eu e ela. Mas não se pode pedir a uma garota que toma chá de frutas a racionalidade, a linearidade, a clareza da que toma chá preto.

jogando tudo fora II

Ele sentou-se na cama de onde eu não desejava sair durante todo o fim de semana. Perguntou-me com ensaiado interesse sobre o meu sentir, sobre o meu amor, sobre o meu pensar. Respondi-lhe com um par de de superficialidades que lhe saciariam a curiosidade ou lhe abateriam a culpa - qualquer que fosse a razão daquela quase demonstração de carinho. Não nos olhamos nos olhos. Seu foco estava na tangerina que ele abria vagarosamente. Meu foco estava num postal que acabara de chegar desde um frio país europeu. Já não somos mais companheiros, parceiros, cúmplices. Nos assemelhamos mais à poeira que sobe na estrada de terra depois da travessia de um automóvel... uma incômoda lembrança do que passou.

esclarecimento.

Viver de arte é cometer absurdos para sempre ter sobre o que escrever.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

onde está o sol?

Não se pode tomar chá com muito açúcar nem comer guacamole com muito sal. Não se pode amar até a morte nem viver fugindo do amor. Não se pode passar tanto dias sem ver a luz do sol ao despertar-se pela manhã.
Já não podia mais olhar pela janela e ver o branco do prédio ao lado perder-se no branco das nuvens que tomaram o céu há semanas. Se ao menos o dia estivesse acinzentado, se houvesse barulho de chuva e cheiro de terra molhada... ah, seria gostoso viver assim. Só que o dia estava branco. Absolutamente branco. O barulho de uma construção por perto me entrava pelos ouvidos sem cessar, o clima estava abafado, sufocante; o dia branco!
Tranquei as portas, fechei as janelas, cerrei as cortinas. Abriguei-me no refúgio de meu sono decidida a sair dali apenas quando o dia não estivesse tão odioso. E por ali fiquei horas, ora lendo ora escrevendo poesia indignada, cartas de amores distantes, crônicas do que já se foi. Fiquei ali, com meu coração apertado, pensando "que vida curta!" depois de receber uma trágica notícia.
Foi de um instante a outro que as cores do quarto mudaram. Um amarelo claro invadiu tudo ao entrar por um pedacinho de janela descoberta pela cortina. Foi tão rápido e ainda assim vi tudo em câmera lenta: os desenhos ao lado de minha cama, a parede ao lado da cama vazia, o armário embutido... de repente todos eles tinha nuances de amarelo em si. Senti tamanha euforia que só pensei em agarrar as cortinas, empurrá-las para fora do meu caminho de luz.
Me faltou tempo para tal. O raio de alegria não passava de um buraquinho no meio daquela multidão de nuvens que insistem em continuar colocando-se entre o sol e minha pessoa. A alva iluminação escassa estava de volta e meu mau-humor também.

to Sarah Kay.

(...)


I just wanted you to know that you've inspired me to take my writings out for a walk. They spent way too much time inside journals, notebooks, word files. They could use some fresh air.

memórias de meu chamo.

Nos conhecíamos de vista, eu e ele, porque meu quarto era ao lado da porta da residência à qual ele visitava com frequencia. Nos conhecíamos de vista e não tínhamos a mínima pretensão de tornarmo-nos amigos, a garota que andava de sutiã pela casa e o garoto que só usava listras. Nos conhecíamos de vista e não havia nada que nos fizesse pensar, a guria que tinha o boteco mais próximo como segunda casa e o guri que não saía na sexta à noite, que teríamos vida em comum, coisas a compartilhar. Nos víamos, nos saudávamos à distância e seguíamos nossos caminhos.
Foi do meu tédio que surgiu nossa amizade. Fui fazer um chá na cozinha e lá estava ele, em seu computador, na mesa da cozinha. Coloquei a água no fogo e lhe toquei os ombros como se fôssemos íntimos. Senti-o eriçar-se, morrendo de vergonha. Segurei o riso e lhe falei em espanhol, lhe perguntei disso e daquilo, e quando a água atingiu seu ponto de ebulição já havia carinho entre nós suficiente para gerar sorrisos em soldados em campo de batalha. Foi bem assim que aconteceu.
Posso dizer que nosso amor cresceu a passos lentos, passos estes que dávamos por corredores abertos em noites frescas de outono. Passávamos horas e mais horas descobrindo com sede sôfrega um ao outro. Nunca descobri o motivo, mas a verdade é que comecei a precisar de uma dose noturna dos encantos dele para sobreviver ao dia seguinte, e provavelmente o mesmo aconteceu a ele. E na cadência de nossos passos, compusemos nosso tango.
(...)

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

do dia no qual minha aula foi cancelada por motivos obscuros.

Um dia acordei sem vontade de ter aula de direção. É que dirigir nunca esteve no meu hall de Coisas Que Me Encantariam Aprender. Na verdade, esteve mais no de Coisas Que Nunca Faria Caso Tivesse Plata Para Tal. Porém, não tenho plata para tal e aos 20 anos fui obrigada a tomar aulas de direção.
No dia supracitado quis com muito ardor não ter aula. Tentei não desejar o mal à instrutora. Tentei e tentei e não consegui, foi mais forte que eu. E a pobre da instrutora, ai ai ai... teve uma indigestão das brabas, daquelas que te fazem desejar a morte à um sofrimento intenso assim. Isso foi ela que me contou na aula seguinte.
Quando ela entrou de férias, me coube ter aulas com um negão carioca que me fazia escutar os sambas do Carnaval 2012 da Sapucaí e tinha em seu retrovisor patuás de tudo que era religião, brasileiras e estrangeiras.
- São presentes de ex-alunos. Quem sou eu pra não acreditar na força de cada um destes elementos? Deixo tudo aí.
E aí veio novamente aquela vontade de não ter aula; chovia e dirigir na chuva, sabe como é, né? Né? Né. Não queria, não queria, não queria. Sentei no pilotis do bloco, agradecendo aos céus por cada carro que não era um Pálio, não era vermelho e não tinha AUTO-ESCOLA escrito em negro sobre um fundo amarelo. Ainda lutava contra meu impulso de desejar o mal ao próximo, mas às vezes esse moléstia se faz demasiadamente intensa em mim.
Vinte minutos de atraso e subi triunfante de volta à casa. Já com o telefone na mão, pronta para ligar para a tal auto-escola e remarcar minha aula, ouvi a buzina do temeroso carro. Pálio, vermelho, AUTO-ESCOLA.
Peguei minha bolsa, meu casaco, pus de volta os sapatos de dirigir. Coloquei a chave na porta e girei, desolada. E ela parou, ficou presa. Presa a chave na porta, presa eu ao apartamento. Girei para todas as direções possíveis e nada dela se mexer. Nessa hora o senhor já havia interfonado, avisado de sua presença à minha espera. À minha espera, à minha espera... estava eu à tua espera durante os últimos vinte minutos!
Toda a situação me pareceu um tanto quanto engraçada. Ele falando no celular - como sempre - debaixo do meu bloco. Eu não conseguindo pensar em nenhuma outra solução que não chamar o Super-Homem para me resgatar - que seja subentendido que o tal Super-Homem é meu pai. A chuva caindo cada vez mais forte.
Pensei que o universo é engraçado, que ele encontra maneiras muito únicas de nos ensinar lições. Pensei que a energia do querer é muito mais forte do que nos apetece acreditar. Pensei que só é realmente forte quem sabe trabalhar essa energia a seu favor - às vezes carregando consigo quantos patuás couberem em sua bolsa ou retrovisor.

domingo, 8 de janeiro de 2012

estranhas endorfinas

Desfez-se o nó em minha garganta.
Acalmou-se a taquicardia.

Me dizem volúvel.

Eu digo não sei.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

jogando tudo fora I

- Seus livros ainda estão nas prateleiras da parede, perfeitamente desalinhados. Suas contas se espalham pela mesinha do telefone, algumas abertas. Suas fotos de família seguem ali, onde ele nunca precisaria vê-las. Elas sempre serviram para que os visitantes presumissem que ele tivesse qualquer coisa batendo dentro do peito. A verdade é que tudo continua absolutamente no mesmo lugar onde estiveram nos últimos anos.

- E o que te faz pensar que ele foi embora?

- Minha escova de dentes dormiu sozinha noite passada.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

estive aqui, mas estive longe.

São quatro da manhã e eu escuto o novo single do The XX... e eu não deveria estar pensando em você. Na verdade, The XX me traz memórias de um amor outro, de uma época onde nem imaginei que estaria eu naquele ônibus de merda que me levou pra'quela cidade praiana onde te conheci. Me traz memórias de um amor que nasceu, viveu e morr... e vive platônico até o dia de hoje. O engraçado desse amor é que ele existe de ambos os lados, mas o destino, o acaso, o universo ou todos eles juntos sempre trataram de mantê-lo num plano tão absurdo que ele nunca teve chance de acontecer. Bom, isso até aquele dia quando fechei de vez minhas malas e chorei o choro mais doído da vida. Ele veio me abraçar e foi a última vez que senti seu cheiro tão seu, que costumava sentir toda vez que abria seu quarto pra falar de qualquer coisa que fizesse parar o tempo. Naquela tarde eu o desconcertei tanto com meu pranto que ele teve que me beijar para me calar. Nunca mais falamos sobre isso.
Nossa, The XX também me lembra uma outra insinuação de amor. De uma e outra noite quando comi cerejas e tomei rum com um garoto de beleza mística que muito me cativou. De ouvi-lo dizer que o protagonista de The Catcher in the Rye tinha características em comum com ele. De ouvir suas histórias da Índia e da Bélgica. Me lembro de sentir borboletas no estômago quando ele disse "hey, can I come over to get XX songs? I really like them". Oh, como não me sai da memória a primeira vez que me deparei com os olhos mais azuis... É que chovia e os pingos gelados me estavam quase ferindo a pele, eu só queria entrar de novo no táxi vermelho que me levaria para casa. Mas eu o olhei e por tanto tempo desejei continuar naquele olhar de olhos para que pudesse guardar para sempre todos os traços de seu rosto, as marcas em sua pele, as nuances de seu cabelo.
The XX me remete a lugares tão longes, tão guardados dentro de mim. E ainda assim, nesta noite de verão, escuto The XX e lembro de uma lembrança não tão longínqua, não tão passado quanto as contadas anteriormente. Faz-me pensar em ti e no teu cabelo não cortado. Faz-me pensar que eu queria te abraçar mais forte e dizer que me faz falta passar tempo na tua cama. Sei lá, me faz pensar que... Sei lá.

PS.: escrito sob efeito de coração partido e álcool. Não foi nem será revisado. Tampouco será excluído, posto que é fruto de um sentir intenso que não deve ser ignorado.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

california dream.

Real happiness would be going to the beach with you, lover, those stunning white sand beaches you always told me about. We would run to the shoreline and just stand there as the smell of the ocean would get us drunk and the beauty of the moment would get us high. The sun would make you frown a bit, just enough to make those little wrinkles show around your eyes. And then you would look at me and smile, lover, and then you would take my hand and run towards the sea. We would stop for a while once the water touched our feet and we would run again. It didn't really matter we still had our clothes on. It didn't really matter we'd have to spend the rest of the day all soaked and salty. It didn't really matter we'd get the sits of your convertible wet. Nothing mattered more than making sure every minute we spent together was something marvelous to remember later.

feliz amor velho.

Eu queria que este sentir intensamente não se fizesse tão palpável como aconteceu durante todo o dia de hoje. Queria não estar a ponto de desabar em prantos cada vez que mostrassem como foi a queima de fogos de fim de ano em diferentes capitais do mundo. Desejo mais do que nunca que o mundo torne-se a Pangeia de milhões de anos atrás. Saudade me dói como há muito não doía.